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A imprensa na América Latina

Transformações sociais decorrentes de ditaduras democraticamente transvestidas

Existe um ditado popular que diz que se queremos saber o que vem pela frente, devemos perguntar a quem está voltando. A imprensa em toda a América Latina está sofrendo profundas transformações. Fomentada por governos ditatoriais democraticamente transvestidos, a liberdade de imprensa sorrateiramente tem sido cerceada a cada dia. Talvez seja o momento de consultarmos os jornalistas que atuaram nos anos de 1964 a 1985, período da ditadura no Brasil.

A imprensa daquela época requeria de seus repórteres mais do que habilidades para escrever e capacidade intelectual para analisar situações. Era necessário sagacidade para se desvencilhar dos espiões do SNI (Serviço Nacional de Informação) e muito fôlego para as reportagens de rua, caso necessitasse usar uma das mais antigas habilidades humanas: correr.

Foram 21 anos de opressão, perseguição, mortes, acusações infundadas, mentiras reverberadas pelos órgãos oficiais de comunicação do governo vigente com o intuito de distrair a atenção das massas para o que de verdade ocorria no país. Enquanto isto, dentro das redações a censura se acomodava, com as botas sobre a mesa, um charuto cubano na mão e muitas ameaças, sendo que algumas até de morte, posteriormente cumpridas em algumas vítimas.

Hoje, 25 anos após o fim da ditadura no Brasil, uma nova ameaça começa a tomar forma em todo o continente Americano. Governos ditatoriais implantados nas Republicas da Venezuela, com Hugo Chaves, Bolívia, com Evo Morales, Argentina, com Cristina kirschner e no Brasil, com os conglomerados de comunicação, empresários e seus asseclas no Senado, Câmara Federal e repartições públicas de todo o país, fazem ressurgir a censura e regulação de órgãos de comunicação, segundo princípios corporativos e governamentais. Nunca segundo a vontade do povo!

Trata-se de um grande complô com a finalidade de perpetuar grupos e líderes no poder, tirando do caminho os que primeiro se levantam e denunciam tais práticas tão enraizadas nas elites dominantes como corrupção com a coisa pública. Ou seja, querem silenciar a imprensa que é um instrumento fundamental para a manutenção da democracia.

É claro que há corruptos e corruptores dos dois lados, pois em todos os países do mundo existe a imprensa ávida por lucro, aquela que transforma a notícia em um produto e manipula segundo seus interesses ou de seus financiadores. E é justamente no meio deste fogo cruzado que atualmente os jornalistas se encontram. De um lado a imprensa golpista, sem generalizar, são apenas uma parcela do grande contingente de veículos e, geralmente, os conglomerados, e de outro lado os governos.
Analisemos a questão da obrigatoriedade do diploma para a profissão de jornalista, derrubada pelo Supremo Tribunal Federal, mas que por meio de PEC (Projetos de Emenda à Constituição) na Câmara dos Deputados, ameaça voltar à validade. Quem perde e quem ganha com a não obrigatoriedade do diploma para exercício da função?

Quem ganha são os conglomerados que terão profissionais – quando o forem – habilitados em outras áreas, sem comprometimento com o código de ética dos jornalistas, que defenderão apenas a visão patronal para manutenção de seus empregos, derrubando os salários acertados por meio de acordos entre sindicatos e transformando o factual em opinativo. Ou seja, o jornalista por formação é um profissional genérico que entende de tudo um pouco – ou um pouco de tudo – e é responsável por descrever da forma mais acessível possível os acontecimentos ao seu público. O jornalista não formado será um profissional com visão limitada e delimitada, segundo sua formação.

Façamos então o que está proposto na primeira linha deste artigo, que é perguntar a quem atuou em redação no período anterior, durante e após à ditadura militar. Um dos mais célebres jornalistas brasileiros, Alberto Dines, diz o seguinte no livro “O papel do jornal”, editora Summus (1986).

“Embora seja formado em coisa alguma, muito menos em jornalismo, desde 1963 – com apenas 11 anos de experiência profissional – senti a necessidade de associar-me a uma escola (no caso a PUC Rio) para sistematizar e organizar minha experiência. Este tipo de associação nunca deixou de apresentar grandes vantagens para mim, porque é na sala de aula, no exercício da teoria e na avaliação da prática, que o profissional pode enxergar mais longe. A reflexão não precisa necessariamente ser convertida em pomposas doutrinas, mas pode converter-se em conceitos e, sobretudo, ideais.

Não existe melhor lugar para usinar a prática com a teoria do que na universidade. Quem aprende gramática, escreve com correção, quem pensa bem, escreve bem, mas existem técnicas jornalísticas e filosofias do jornalismo que precisam ser trabalhadas conjuntamente, longe da correria dos ‘fechamentos’, das injunções e precariedades do dia a dia. A sala de aula, conveniente e necessariamente equipada – em termos materiais como humanos – é insubstituível para fundir ética com técnica, ideal com real, de modo a impedir que algumas vestais, quando lhes dá na veneta, atribuam-se o papel autoritário do pontificar sobre o que é certo ou errado.

A campanha contra o ensino do jornalismo, a pretexto de proteger a imprensa do abominável licenciamento, na verdade, inspira-se em aberração autoritária ainda maior – a crença de que o jornalismo é apenas ‘vocação’ sem compromissos maiores com a sociedade, missão para alguns iluminados escolhidos por outros coleguinhas iluminados que galgaram o poder ou receberam de mão beijada”. (Alberto Dines – O papel do jornal, 6ª edição, página 22, editora Summus).

Percebe-se que Dines é enfático ao referir-se à importância do ensino, educação, busca de conhecimento e isto sempre atrelado a universidade. Se querem acabar com a graduação, que transformem o jornalismo apenas em especialização onde profissionais de outras áreas poderão adentrar ao mundo da notícia, aprendendo técnicas, filosofia, ética e como portar-se no segmento de comunicação, dentre outras necessidades não menos importantes.

O que não pode é deixar sem regulamentação, com brecha jurídica para todo tipo de interpretação uma área tão importante para a sociedade. Somente poucas pessoas entenderam a verdadeira importância de discutir o tema e posicionar-se a respeito. O que está em jogo não é apenas o segmento de comunicação, liberdade de imprensa e direitos trabalhistas, mas sim a democracia, o direito à informação de qualidade e o perpétuo combate à corrupção e maus hábitos dos que governam as nações.

Neste momento de incertezas quanto ao futuro da profissão, é oportuno que a categoria estudantil, de todos os cursos, entidades como OAB (Ordem dos Advogados) que já aderiu à causa, instituições de classe, sindicatos, associações, universidades e pessoas públicas verdadeiramente comprometidas com a nação manifestem apoio à luta do jornalismo que é a mesma luta pela manutenção da democracia, liberdade de imprensa e regulamentação das profissões.

Um país sem pessoas devidamente educadas nas escolas, conhecedoras dos seus direitos e deveres e que conduzam suas próprias vidas estará sempre sujeito ao canibalismo corporativo e governamental de líderes sem escrúpulos e que visam o lucro a qualquer preço. Olhem para a Amazônia sendo devastada por fazendeiros políticos ou políticos a serviço do Capital, olhem para o interior do país onde não há água encanada, esgoto, infraestrutura e votos são comprados por míseros centavos, mas que para quem compra é o pão que vai matar a fome.

Quem denunciará tais abusos?

Osni Alves J
Jornalista SC3416JP
msn: osni.reporter@hotmail.com
blog: www.osnialvesj.blogspot.com
twitter: osnialvesj

Autor:Osni Alves JJornalista

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