Curso Sindical, realizado em Santa Catarina, reúne trabalhadores e lideranças para problematizar as dificuldades de mobilização dentro de um sindicato
Análise de Pedro Carrano
02.12.2010 – Os impactos do período neoliberal aprofundaram os problemas para a organização da classe trabalhadora no Brasil, particularmente em seus locais de trabalho, o que reflete hoje na atuação e fragilidade dos sindicatos.
A terceirização, os contratos temporários, os diversos vínculos empregatícios em uma mesma unidade de produção, resultado da reestruturação produtiva, ainda são interrogações para uma proposta organizativa.
A rotatividade no emprego alcança um quadro considerável de trabalhadores nas empresas. Outros mecanismos adotados pelo capital, caso da participação nos lucros e resultados (PLR), capturam o imaginário do trabalhador, sob o disfarce de colaboração entre quem compra e quem vende sua força de trabalho.
A própria sindicalização é um desafio. Dentre as seis centrais sindicais constituídas hoje, que representam uma base de 19,728 milhões de trabalhadores formais, apenas 4,838 milhões são sindicalizados (dado que não abrange a CSP-Conlutas, ainda não registrada, e a Intersindical, que se mantém como instrumento para a organização).
E quantos trabalhadores, dentre estes, enxergam nesses espaços uma referência de identidade, de construção, de ferramenta para conquistas de direitos?
São algumas constatações da quarta etapa do Curso Sindical, organizado por educadores ligados à Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF), e que tem sua primeira experiência em Santa Catarina, com dirigentes e trabalhadores da base de cerca de 17 entidades, entre sindicatos e federações do estado.
O curso tem o objetivo de formação de lideranças na apropriação do método do materialismo histórico e dialético, da história do sindicalismo e da luta de classes no Brasil. Com base na teoria, busca coletivamente atacar problemas organizativos e próprios da luta de classes, trocar experiências e traçar linhas de atuação.
Um dirigente do sindicato dos bancários de Blumenau, cansado de escutar frases como “a greve do sindicato” por parte dos companheiros, nas agências, relatou a dificuldade de o trabalhador enxergar o sindicato como uma construção da categoria. A formação de novos quadros, a organização da juventude que se insere no mundo do trabalho, sem perspectiva de carreira e sem experiência organizativa, é uma questão que se coloca hoje para o movimento sindical.
As vitórias não são sentidas pela categoria como resultado da ação do sindicato. Mas as derrotas e ataques – lembrou Manoela Lorenzi, educadora do curso sindical – normalmente são.
Sabemos que as questões que se apresentam hoje não são resultado apenas da disposição para a luta de suas direções sindicais, frente às mudanças estruturais no mundo do trabalho. No entanto, houve espaço para a avaliação de opções equivocadas no que toca o trabalho de base. No final dos anos 1970, no momento de ascenso da luta sindical, a perspectiva organizativa partia dos locais de trabalho (como explica Lorenzi, com base em estudos do educador popular Emílio Gennari).
Porém, as seguidas vitórias das oposições centraram a ação na conquista das direções sindicais, deixando de ampliar a questão organizativa com os trabalhadores na base. O centro do trabalho passou a ser a agitação nos portões da fábrica. A própria acomodação do dirigente/funcionário do sindicato foi colocada em questão: “Naquela época, as direções estavam no local de trabalho”, provocou uma companheira presente no curso.
A mídia hegemônica é inimiga da organização sindical, na medida em que uma paralisação dos transportistas de Blumenau – para tomar um exemplo citado no curso – terá os meios de comunicação buscando isolar a categoria do restante dos “cidadãos”, “prejudicados” com a greve – na linguagem do poder.
Em sua defesa, apenas o panfleto da categoria não alcança escala para o embate contra a ideologia do empresariado. Certamente, a velha demanda continua: o número de tiragens impressas dos sindicatos de uma central sindical como um todo resultaria em um veículo de comunicação que disputaria nas bancas com os jornalões.
Outra amarra do movimento é a judicialização da luta sindical, o que interfere na ação dos trabalhadores, como na impossibilidade de um piquete. No campo organizativo, esse dado se reflete na dependência do setor jurídico para “resolver” os diferentes problemas do trabalhador, uma prática que se internaliza e reproduz. A direção sindical organiza no seu entorno um corpo de assessores em comunicação, assessoria política, negociação, jurídico, piqueteiros, mas não dá ênfase a um trabalho com novas lideranças.
No curso, um dos apontamentos foi o de que, sem deixar de lado a preocupação com as necessidades econômicas de uma categoria, é urgente entender o sindicato como um polo dinâmico de lutas, voltar às ruas, fomentar as lutas na região onde está inserido, buscando pontes com meios de comunicação alternativos, apoiar (e ser apoiado) por outros movimentos sociais.
Análise publicada no www.brasildefato.com.br