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Retorno do Ministério das Comunicações é marcado por fisiologismo e conflito de interesses

Na noite de quarta-feira, 10/6, fomos surpreendidos pela edição da Medida Provisória nº 980 alterando a estrutura organizava do governo federal para recriar o Ministério das Comunicações e o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.

Assim como a sua extinção, a recriação do Ministério não veio acompanhada de qualquer debate do atual governo sobre uma política pública para a área da Comunicação que motivasse o desmembramento, não há nenhuma sinalização de qual o planejamento e os objetivos que se pretende alcançar com o novo órgão.

Além do desmembramento, a MP fez outra alteração na estrutura do governo, tirou a Secretaria Especial de Comunicação Social (SECOM) da Secretaria de Governo da Presidência da República e a subordinou ao recém criado Ministério das Comunicações.

Está claro que os reais motivos do presidente Jair Bolsonaro para ter desmembrado os dois ministérios não têm relação com a adoção de políticas para o setor, mas visa usar a estrutura do Estado para angariar apoio político e ampliar sua base no Congresso Nacional com o chamado “Centrão” e beneficiar de forma indevida aliados, no caso um concessionário de rádio e televisão.

É a tal “velha política” em ação. São os movimentos do presidente para tentar sair do isolamento político e impedir que propostas para seu afastamento avancem no Congresso Nacional.

Além disso, Jair Bolsonaro já anunciou o novo ministro, o deputado federal pelo PSD/RN, Fábio Faria, que é marido da apresentadora e uma das filhas de Silvio Santos, Patrícia Abravanel. A indicação torna ainda mais evidente o fisiologismo e a imoralidade do ato do presidente da República.

Bolsonaro coloca na direção do Ministério responsável por controlar e fiscalizar as concessões de rádio e televisão e, também, por distribuir verbas publicitárias do governo federal, uma pessoa que está diretamente vinculada a uma concessão.

O grupo Silvio Santos possui a concessão do Sistema Brasileiro de Televisão (SBT), a segunda maior rede de TV aberta do país, com 9 emissoras de TV próprias com sedes em São Paulo, Jaú, Ribeirão Preto, São José dos Campos, Rio de Janeiro, Nova Friburgo, Brasília, Porto Alegre e Belém, além de sociedade na Rede Massa (40%), TV Sorocaba (20%) , SBT Interior (40%)e TV Alterosa Leste (administrada pela Rede Alterosa). Além de outras empresas na área financeira, de cosméticos e outras.

Está evidente que a nomeação de Fábio Faria representa flagrante conflito de interesse no exercício dessa função. Além disso, pode caracterizar tráfico de influência e improbidade administrativa por parte do presidente da República, conforme disposto no artigo 4º da Lei de Improbidade Administrativa: “Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos”.

Segundo a jurisprudência, improbidade administrativa é o designativo técnico para a chamada corrupção administrativa, que, sob diversas formas, promove o desvirtuamento da Administração Pública e afronta os princípios nucleares da ordem jurídica (Estado de Direito, Democrático e Republicano), revelando-se pela obtenção de vantagens patrimoniais indevidas às expensas do erário, pelo exercício nocivo das funções e empregos públicos, pelo “tráfico de influência” nas esferas da Administração Pública e pelo favorecimento de poucos em detrimento dos interesses da sociedade, mediante a concessão de obséquios e privilégios ilícitos.”[1]

É de conhecimento público que o SBT tem sido amplamente beneficiado por medidas do governo federal desde a gestão de Michel Temer. A emissora tem realizado em várias oportunidades, proselitismo político para defender propostas do governo, como no caso da Reforma da Previdência, deu espaço desproporcional durante as eleições presidenciais ao candidato Jair Bolsonaro, e recentemente deixou de veicular de forma discricionária e por ordem direta de Silvio Santos uma edição inteira de seu telejornal para evitar um tom crítico ao presidente da República. Tais atitudes estão em total desacordo com as obrigações e regras das concessões públicas, que vedam explicitamente o proselitismo e censura prévia.

Também é importante destacar que, com a ida da Secom para o Ministério das Comunicações, também a Empresa Brasil de Comunicação (EBC) passa a estar subordinada a esta pasta, num momento em que está na pauta do governo a privatização da empresa.

O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação defendeu em vários documentos o retorno do Ministério das Comunicações. No entanto, condenamos veemente a medida de Bolsonaro, que cria uma estrutura que já nasce aparelhada por interesses privados e em desacordo com os princípios da moralidade, impessoalidade e legalidade previstos na Constituição Federal.

São Paulo, 11 de junho de 2020

Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação

Coordenação Executiva:

Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé
Coletivo Intervozes
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee)
Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj)
Central Única dos Trabalhadores (CUT)
Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço)
Federação Interestadual dos Trabalhadores e Pesquisadores em Serviços de Telecomunicações (Fitratelp)

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