Os jornalistas brasileiros, reunidos em seu 36º Congresso Nacional, em Alagoas, quando se completam 50 anos do golpe civil-militar – que teve a participação dos empresários da comunicação e setores conservadores da sociedade -, e no momento em que o país faz um enorme esforço de resgate da verdade histórica e de superação da herança deixada pelo brutal regime ditatorial, reafirmam a defesa intransigente da democracia e do jornalismo como atividade profissional indispensável às conquistas democráticas.
Os jornalistas enfatizam, neste Congresso, seu entendimento de que a democracia é um valor estratégico em todas as suas dimensões: a política, a econômica e a social. Varrer definitivamente os vestígios da ditadura da vida nacional é essencial para fortalecer o caminho democrático, como evidenciou o combativo ato realizado em Maceió, com importantes depoimentos dos jornalistas Pinheiro Salles, preso e torturado pelo regime, e Audálio Dantas, ex-presidente da FENAJ que, à frente do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, em 1975, liderou a luta pela responsabilização do Estado pela morte de Vladimir Herzog.
A exigência de revisão da Lei de Anistia, com a apuração dos crimes e a punição dos responsáveis por torturas, assassinatos e desaparecimentos, é a conclusão natural do trabalho das Comissões da Verdade, organizadas também pelos Sindicatos e pela Federação a partir da decisão do 35º Congresso Nacional dos Jornalistas, realizado no Acre, em 2012.
Em quatro dias de trabalho, marcados pelo debate livre, democrático e plural, os participantes, vindos de todas as regiões do país, analisaram os problemas e desafios atuais dos jornalistas, tomando decisões para nortear a ação da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), em defesa das condições de vida e trabalho da categoria e suas iniciativas no cenário nacional.
Precedendo o 36º Congresso Nacional dos Jornalistas, foi realizado o 1º Encontro Nacional de Jornalistas pela Igualdade Racial (Enjira), marcando de forma positiva o Congresso pelas reflexões e contribuições apresentadas para que alcancemos a igualdade étnico-racial na mídia. Da mesma forma, a necessidade de combatermos toda forma de preconceito e avançarmos na luta pela equidade de gênero e pelo respeito às pessoas com deficiência esteve no centro dos debates, assim como a violência contra jornalistas.
A impunidade estimula a violência policial crescente contra os movimentos sociais e a atividade jornalística. Desde as manifestações de junho de 2013, centenas de jornalistas foram agredidos em coberturas de rua pela polícia (mais de 80% dos casos), mas também por participantes de manifestações. O terrível ápice desta onda de violência foi a morte do repórter-cinematográfico Santiago Andrade, da TV Bandeirantes do Rio, atingido por um rojão, enquanto registrava confrontos. Nosso Congresso homenageia o companheiro Santiago e grita: basta! Não podemos aceitar a repressão da PM aos jornalistas, que registram a violência desmedida com que os policiais atacam manifestantes. Exigimos a desmilitarização da polícia, uma medida democrática.
Tampouco podemos aceitar agressões a jornalistas, venham de onde vierem. Compreendemos as críticas aos veículos de comunicação, mas não admitimos qualquer forma de violência contra os trabalhadores jornalistas e exigimos respeito ao trabalho dos profissionais. Exigimos a punição dos responsáveis diretos pela morte de Santiago, ao mesmo tempo em que denunciamos a responsabilidade da Rede Bandeirantes, por não ter garantido condições de segurança ao seu empregado. Exigimos das empresas de comunicação a adoção de um Protocolo de Segurança, a fim de evitar novas tragédias, e exigimos do Estado brasileiro medidas concretas para a salvaguarda dos jornalistas e demais profissionais da comunicação.
Durante o 36º Congresso Nacional dos Jornalistas, pudemos discutir a pressão crescente pela precarização das relações trabalhistas: o desrespeito sistemático das empresas à jornada de trabalho, o acúmulo de funções, ampliado com a chegada das novas plataformas, e a falta de vínculo em carteira – com os “frilas” que se eternizam e o crescimento no número de contratações via pessoa jurídica (PJ). Contando com a importante contribuição da Federação dos Jornalistas da América Latina e do Caribe (Fepalc) e da Federação Internacional dos Jornalistas (FIJ), entidades às quais a FENAJ é filiada, decidimos nos manter firmes na defesa dos direitos trabalhistas, buscando, sobretudo, aprofundar a organização sindical na base para permitir essa resistência.
A democratização dos meios de comunicação, compromisso de longa data da FENAJ, ganha urgência à medida que as novas tecnologias de informação transformam-se em armas nas mãos de empresários inescrupulosos, que ampliam a concentração da propriedade na mídia e usam a tecnologia para acentuar a precarização do trabalho. Neste sentido, a FENAJ continua apostando no Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) como o melhor protagonista para aglutinar os diferentes atores sociais que lutam pela democratização da comunicação.
Um momento especial de nossa atividade foi a homenagem prestada ao jornalista e professor alagoano José Marques de Melo, também perseguido pela ditadura, e que dedicou sua vida de forma notável ao desenvolvimento do ensino e da prática do jornalismo. Compartilhamos com ele a defesa intransigente do diploma de nível superior como pedra angular de nossa atividade profissional. A luta para retomar nossa regulamentação avança, e decidimos reforçá-la e ampliá-la, como ponto fundamental do avanço social em nosso país. Afinal, um país verdadeiramente democrático deve valorizar o jornalismo como forma de garantia da liberdade de expressão e valorizar os jornalistas, apoiando a luta pela qualificação e autonomia profissional e por condições de trabalho decente.
Maceió (AL), 5 de abril de 2014.
Plenária final do 36º Congresso Nacional dos Jornalistas