Pela segunda vez, a RBS TV, afiliada da Rede Globo em Santa Catarina, usou imagens da Marcha das Vadias para ilustrar uma nota no Jornal do Almoço sobre a Marcha da Maconha. A denúncia veio de Angela Medeiros, ativista do movimento das mulheres negras e estudante de Psicologia da UFSC, que aparece no vídeo com o filho de um ano no colo. O vídeo que trazia a nota do colunista Cacau Menezes já havia sido retirado do site por determinação da justiça em novembro de 2013, três meses depois de ir ao ar. Na última quarta-feira (1/6), mais uma vez a “notícia” sobre a Marcha da Maconha, que estava prestes a ocorrer, foi coberta com as mesmas imagens da Marcha das Vadias, realizada em 2011.
Vídeo aqui
“Enquanto recebia mensagens de amigos, o que eu vivi foi um verdadeiro ‘déjà vu’”, conta Angela sobre a repetição do erro pela mesma rede de TV. Em 2013, ela já havia acionado a RBS na justiça para pedir indenização por danos morais pelo uso indevido de imagem.
A sentença de primeira instância foi favorável para a autora, mas a ré recorreu da decisão e o processo de número 0003421-25.2013.8.24.0090 segue no Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Angela pede reparação de R$ 30 mil, sendo R$ 20 mil para ela e R$ 10 mil para o filho.
“Eles (representantes da RBS) alegaram que se eu estava na Marcha das Vadias poderia estar em qualquer outra. Não sou usuária de maconha e nem participaria desta marcha. Como exibir a minha imagem, segurando meu filho bebê no colo, em uma manifestação da qual não participo?”, questiona ela.
Maiores maconheiros de Florianópolis
O vídeo foi retirado do site por decisão da juíza Morgani de Melo do Juizado Especial Cível e Criminal da Trindade que aceitou o pedido de Angela para que a segunda ré, Globo Comunicação e Participações S/A, retirasse “a matéria jornalística ou editasse de forma a não mais serem utilizadas as imagens sob pena de multa diária de R$ 1 mil”.
“A autora Ângela, segurando no colo seu filho, também, autor, Pedro, presente na Marcha das Vadias, foi indevidamente utilizada para ilustrar a Marcha da Maconha, com o agravante, ainda, de o comentarista Cacau Menezes afirmar que nessa estariam presentes os maiores maconheiros de Florianópolis, insinuando, portanto, que a autora e o filho seriam usuários dessa droga”, afirma a juíza no documento em que concede a antecipação da tutela.
Nem maconheira, nem simpatizante
Ângela diz que se sente desrespeitada como mãe e militante feminista, especialmente porque o vídeo continua no portal. Ela pretende acrescentá-lo ao processo e pedir a retirada novamente. “É um absurdo! A primeira coisa que pensei foi na falta de profissionalismo. Trata-se de um jornalismo totalmente irresponsável, sem nenhuma responsabilidade com as pessoas, com uma mãe. Vou endossar a denúncia no processo”, afirma.
Os pais de Angela assistiam ao jornal nas duas vezes em que o vídeo foi ao ar. “Meu pai que mora em outro estado ficou indignado de eu aparecer numa marcha com o meu filho pequeno. Ele questionou se eu estava aqui para estudar ou fumar maconha. Além de eu não fumar maconha, não sou defensora da causa”, disse ela.
O que diz o Código de Ética dos Jornalistas
O presidente do Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina, Aderbal Filho, lembra que a divulgação de informação, precisa e correta, é dever dos meios de comunicação pública, independente da natureza de sua propriedade. E que o compromisso fundamental do jornalista é com a verdade dos fatos. O Código de Ética dos Jornalistas diz em seu artigo 7 que trata da conduta do profissional: “o compromisso fundamental do jornalista é com a verdade dos fatos e seu trabalho se pauta pela precisa apuração dos acontecimentos e sua correta divulgação”.
De acordo com o presidente, qualquer cidadã ou cidadão que se julgue prejudicada/o de alguma forma por uma divulgação jornalística incorreta ou uso indevido da imagem tem o direito de buscar a reparação. Ele se diz surpreso pelo não reconhecimento do erro pela rede de TV. “Além de não reconhecer o erro e recorrer da decisão, ainda reincidiu ao reutilizar a imagem de uma manifestação pública com uma determinada finalidade para referir-se a outra, de finalidade distinta. O mínimo que se poderia esperar, já que a RBS sabia que uma pessoa havia se declarado prejudicada, era respeito. Não dá para defender o indefensável”, afirma o representante.
Posição da rede de TV
Romi de Liz da comunicação corporativa da RBS TV afirmou que o vídeo será retirado do site. “O equívoco ocorreu durante o processo de edição. A matéria foi despublicada do site, assim que a produção tomou conhecimento da situação. Pedimos desculpas aos envolvidos”, disse em nota enviada por e-mail ao portal Catarinas.